O mercado dos sonhos

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Estamos entrando em uma era em que ler é pop. O lado bom disso é que ninguém mais te olha como se você fosse o mais estranho dos nerds quando diz que entre seus hobbies favoritos está a leitura. E quando diz que escreve, também não esperam de você uma erudição sem paralelo.

Com isso, o mundo da escrita ficou mais acessível. Hoje literalmente qualquer um pode escrever um livro e publicá-lo não é mais uma tarefa tão complicada. Trata-se ainda de um processo dispendioso, mas mesmo assim, um sonho bem mais fácil de alcançar.

E quem tem aproveitado o nicho para fazer algum dinheiro são as editoras. Nos últimos anos, novas editoras se proliferaram com uma velocidade incrível no mercado. A maioria das novatas vestiu a camisa de apoio ao novo escritor. Com essas editoras, o escritor consegue tiragens menores a preços nem tão exorbitantes assim, mas sua visibilidade é bem pequena e todo seu marketing depende praticamente só dele.

Algumas grandes editoras também não quiseram ficar de fora. Como reforça o alerta do excelente blog Um Livro Qualquer, muitas editoras se tornaram uma verdadeira empresa de livros que se especializam em se aproveitar do sonho dos outros para enriquecer. Elas ganham do escritor para lançar seu livro como um piloto. Se o livro não vingar, pelo menos não perderam nem um centavo se quer com a produção; mas se, por acaso, o autor se mostrar um sucesso em potencial, talvez ele seja “promovido” ao tipo de autores profissionais da editora.

Um artigo da revista Piauí de novembro de 2011 levanta ainda outras questões sobre o assunto. Com a pressa do mercado por novos livros, a qualidade do que se escreve é algo que pode ser deixado em segundo plano. O mercado quer escritores que escrevam a toque de caixa, mas pouco importa o tema, a qualidade com que escrevem,
a linguagem usada; o importante é vender mais e mais. Essa falta de zelo é notável pela má qualidade de textos que vemos hoje. Até uns anos atrás era quase impossível encontrar erros de grafia ou gramática nos livros; hoje não tem um livro em que um errinho de português não tenha passado. Os revisores são cada vez mais subestimados e dispensados; a tarefa de revisão de texto foi agregada ao cargo de escritor. O editor, que deveria fazer um trabalho parecido, hoje nada mais é do que uma espécie de olheiro literário. Alguns escritores até parecem terem sido mal informados sobre a economia em revisão e a necessidade de fluência no idioma nativo.

E então surgem dia após dia infinitos cursos de escrita criativa e sobre o processo de publicação de um livro. Escritores que publicaram apenas um ou dois livros, mas foram um sucesso imediato de vendas para a editora, são incentivados a dar cursos desse tipo – para todos os gostos e bolsos – para angariar mais incautos para os bolsos das editoras. Os cursos em si não são ruins e nem quem os procura está errado. Atividades para melhorar uma habilidade é imprescindível para quem leva a sério um sonho. O cruel é o objetivo por trás da maioria desses cursos (porque nem todos são terreiros de editoras).

Destaco o seguinte trecho da matéria da revista Piauí:

“Ao se privilegiar as obras, se pressupõem que nem todos podem ser autores, e que nem todas as autorias são iguais. E nada mais natural, depois de tanto esforço de marketing a celebrar a figura do autor, que a obra tenha passado a ocupar um lugar secundário e insignificante.”

A obra perde status para o produto. Mais vale um autor carismático que o que ele escreve.

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